sexta-feira, 20 de abril de 2007

Sobre o desemprego dos licenciados

Agora menos polémica e só análise. Vamos pensar colocar entre parênteses a questão da população desqualificada e centrar atenção sobre os licenciados desempregados ou sub-empregados. Lembro-me que há uns tempos, no meio de outra polémica com outros peões, já tinha escrito que, se quisessemos prosseguir a discussão sobre esta matéria, então iríamos (ou iria eu) desembocar na questão da «liberalização dos mercados, neste caso dos serviços, pela óbvia razão porque é neste sector que a maioria dos licenciados procura emprego; é que: mercados fechados = maior desemprego».

Se isto estiver certo, então a argumentação do BE - agora independentemente a quem ela serve e que tipo de pessoas representa, etc. - pode revelar-se contraproducente. Na medida em que existe desemprego licenciado - com as características particulares a que tenho vindo a aludir desde há muito -, e na medida em que está fora de questão o Estado resolver o problema absorvendo estas pessoas em massa, resta tentar perceber como é que o mercado podia incorporar estas pessoas nas áreas para as quais elas se qualificaram. E aqui, o argumento a favor da liberalização e da abertura da economia é um argumento forte; isto é, muitas coisas apontam para que uma menor regulação do mercado de produtos (e eventualmente de certas regiões do mercado de trabalho, mas isto aqui é mais duvidoso porque já existem mecanismos contratuais flexíveis o suficiente) ou medidas que incentivam ao investimento estrangeiro viessem a favorecer estas pessoas e dar-lhes mais oportunidades.

A ser verdade - e há vários estudos que apontam para estas tendência, desde trabalhos que defendem que as empresas que mais valorizam o capital humano dos profissionais são aquelas que se movem em mercados e fazem face à concorrencia internacional*; que o efeito da educação no crescimento do PIB é mais forte nas economias mais abertas**; que o Estado, por ser um grande empregador dos recursos mais qualificados do país, perverte o funcionamento dos mercados que exigem mao-de-obra mais qualificada, protegendo os insiders com óptimas condições mas deixando à porta os outsiders, entregues a um mercado que o Estado muitas vezes não deixa funcionar (sendo que este mesmo Estado só tem dinheiro para pagar os salários dos insiders, e nenhum para albergar os outsiders)***, etc. - então estamos perante uma espécie de comédia de erros, em que um partido como o BE apoiará medidas mais proteccionistas que são ou impossíveis ou nefastas para os que pretende representar, enquanto que os seus potenciais votantes, descontentes com a sua situação laboral e com a presente incapacidade de retirar da formação que fizeram todos os rendimentos que pensavam ser possível tirar, deviam, em interesse próprio, apoiar um partido que defendesse a reforma do Estado e a progressiva abertura da economia, que lhes traria mais hipóteses de encontrar emprego em empresas que necessitam de mão-de-obra qualificada.

* Dessus, S. (1998), Analyses empiriques des Déterminants de la Croissance à Long Terme, thèse de doctorat en sciences économiques, Université Paris - I
** Maurin, E., et al. (2003), «Mondialisation des échanges et emploi: le rôle des exportations», in Économie et Statistique, nº363-365, pp.33-44
*** Gelb, A. et al. (1991), «Public sector employment, rent seeking and economic growth», in Economic Journal, 101, p-1186-1199.

7 comentários:

CLeone disse...

É uma comédia, nas não de erros. É consistente com a política conservadora do BE, que visa fixar o seu eleitorado à custa do PS, mesmo que isso signifique também à custa do país. Ver outros casos em questões «sociais» (saúde, direitos pessoais, etc.) em que o BE (e o PCP) continuam no quanto pior melhor, com a cereja not opo do bolo das propostas sempre óptimas e nunca boas ou melhores do que o que há. FOi assim que o Parlamento se dissolveu em 2001, e por isso, mas também pela inconsistência da Direita presa ao passado (Cavaco, Portas), por isso, dizia, o combate do PS deve ser claramente contra a demagogia do BE e do PCP, sem se deixar acantonar apenas no rigor. Ainda bem, portanto, o comentário neste post sobre a flexibilidade laboral tão cara a Constâncio, pois contratos fracos (e não cumpridos) já temos em demasia.

A. Cabral disse...

E a causalidade, julguei que havia aqui interesse epistemologico... Sao as economias que se abrem que sao mais dinamicas e que melhor remuneram, ou sao as economias mais dinamicas e que melhor remuneram que se abrem?

Hugo Mendes disse...

Se as economias já são dinamicas e se remuneram bem, para quê se abrirem, então? É que a abertura traz a incerteza associada ao comércio externo; ninguém ganharia com a abertura a este se a economia fosse rica.
Conhece alguma economia fechada e rica (que não dependa de recursos naturais escassos)?

A. Cabral disse...

Abrem em busca de novos mercados e novas rentabilidades, tem a certeza da sua capacidade de competicao. Alias foram as economias fortes que abriram historicamente os mercados mundiais. Foi o Reino Unido no periodo imperial, foi os acordos do GATT e da OMC encabecados pelos EUA e a Europa.

Quanto a economias fechadas e ricas, os chamados Tigres Asiaticos sao disso exemplo. Foram economias muito fechadas durante o seu periodo de formacao industrial. A referencia nessa materia e' o Professor da Universidade de Cambridge Ha-Joon Chang.

Hugo Mendes disse...

"Abrem em busca de novos mercados e novas rentabilidades, tem a certeza da sua capacidade de competicao. Alias foram as economias fortes que abriram historicamente os mercados mundiais. Foi o Reino Unido no periodo imperial, foi os acordos do GATT e da OMC encabecados pelos EUA e a Europa."

Não vejo em que é que isso contradiz o que disse em cima. A abertura permite o enriquecimento.

"Quanto a economias fechadas e ricas, os chamados Tigres Asiaticos sao disso exemplo. Foram economias muito fechadas durante o seu periodo de formacao industrial."

Sim, mas preparando a sua abertura posterior; esta ideia é essencial. Se as fronteiras não se tivessem aberto, o desenvolvimento endogeno teria atingido um tecto e elas teriam estagnado.

A. Cabral disse...

"Sim, mas preparando a sua abertura posterior; esta ideia é essencial. Se as fronteiras não se tivessem aberto, o desenvolvimento endogeno teria atingido um tecto e elas teriam estagnado." Pois a questao e' mesmo essa. E portanto achas que Portugal esta preparado para essa abertura. Eu nao acho.

Hugo Mendes disse...

O que funcionou no Extremo Oriente - sob o regime de Estado autoritários, convém nao esquecer...- não signifique que resulte em Portugal. E eles fizeram mais em 30 anos do que nós em 60, por todas as diferenças existentes.

Qual é estratégia entao para nós? Imitar a estratégia da Coreia do Sul, Taiwan, etc., de há meio século atras, agora até 2035?

Portugal não tem alternativa senão abrir-se, quanto mais não seja porque está dentro da Europa e não fixa as suas regras. E é assim que o pais irá crescer. Pensar que há "estratégias alternativas" é perder tempo.